Tinha como sempre, acordado bem disposto. O pequeno almoço, foi tomado como de costume; "casqueiro", um pouco de queijo, acompanhado com leite e café. Naquele dia estava de serviço interno, sem ter de fazer segurança à pista de aviação de Cufar. O dia prometia um pouco de descanso e até para pôr a correspondência em dia. Eis que de repente sou avisado que, conjuntamente com outros camaradas, tinha de fazer uma guarda de honra ao general Spínola. Até aí tudo bem mas havia um senão. Não tinha cortado a barba. E eu que não gostava de me escanhoar depois das refeições. O pequeno almoço já tinha sido feito à largos minutos. Só havia uma alternativa. Trocar com alguém que fosse para a protecção dos aviões ou cortar a barba. O Gonçalves, mais conhecido por "Fontaínhas", era o cabo destacado para esse trabalho nesse dia, bem como o furriel Tingelinhas e o Barbosa, condutor da viatura blindada, Fox. O camarada Fontaínhas acedeu e trocou de serviço comigo. Fui assim para a pista de aviação com os camaradas citados. O Barbosa conduziu a viatura, ladeando a pista até quase ao fundo e estacionou no ponto do costume, sensivelmente a 20 metros da berma da pista. Senta-mo-nos os três em cima da torre da viatura com a espingarda G3 em cima das pernas, enquanto tirava-mos umas fumaças. Ao longe, na mata de Bedanda, os T6, aviões, pequenos bombardeiros, descarregavam as bombas. O barulho, provocado pelos rebentamentos, era muito. Decorrido algum tempo, os aviões aproximaram-se da pista onde nos encontrava-mos e aterraram. Vem o primeiro e tecemos os nossos comentários quanto à aterragem que foi boa. O segundo avião fez o mesmo de forma magnífica. O terceiro avião também se aproximava. Vamos ver se este também é bom piloto, diz o Barbosa. O piloto trazia a carlinga aberta. As rodas tocaram no chão, ao mesmo tempo que ouvimos o ruído de uma lata a cair no piso da pista. Nesse momento estava eu de costas voltadas para o lado que decorria a cena. O avião passa por nós com muita velocidade e eu ao ouvir o barulho da lata, imaginei que era uma lata de "Fanta", bebida refrigerante muito consumida por nós, de sabor alaranjado. Uma delícia numa terra tão quente como aquela. No mesmo instante vejo o furriel e o Barbosa a saltar abaixo do blindado, correndo aflitos, enquanto este último gritava: foge Almeida que é uma bomba. De facto assim era. As bombas naqueles aviões, eram colocadas na horizontal por debaixo das asas, seguras por garras ou pinças. Ao fazer o bombardeamento, uma dessas bombas, ficou parcialmente solta, não caindo nessa acção de guerra. Quando o avião tocou com o trem de aterragem na pista, a dita bomba acabou de se soltar mas não explodiu, porque animada com a velocidade da aeronave, não teve ângulo suficiente para cair na vertical, "correndo" no chão ao lado do avião hospedeiro. Parou a uma centena de metros onde nos encontrava-mos. Ao encontro dela vieram dois homens especializados em minas e armadilhas que a colocaram de novo em segurança. Com franqueza. Para nós, bem como para o piloto, foi um dia de muita sorte! E fiquei com esta ideia: Não quis cortar a barba com o receio de me sentir mal, o general acabou por não vir e a morte rondou por perto na troca de serviço que fiz. Foi mesmo muita sorte!...
Nunca mais troquei de serviço.
Nunca mais troquei de serviço.
Um relato impressionante de uma das experiências vividas num local distante em tempo e espaço físico. Considero que seguindo o exemplo deste companheiro, os restantes elementos do pelotão deviam partilhar, alguma situação que se recordem da experiência vivida como Pelotão de Reconhecimento Fox 8870. Acrescentando mais valor cultural a este local na Internet.
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